sexta-feira, 15 de maio de 2009

Ao ler este poema, sinto uma enorme saudade da árvore grande, da sua sombra e do seu porte magestoso que respeitávamos como aos nossos mais velhos. Aquela arvore que servia para tudo, brincar, descansar, apanhar a bebedeira do cigarro, o tal visgo, e de quando em vez uma pobre cigarra ou um catitui. Lembram-se das lerpas a cigarros? loucura. Se soubessemos o que sabemos hoje seguramente teriamos escolhido outra moeda. Esta custou caro a largar.
De facto eram locais quase sagrados, onde brotavam os ensinamentos dos mais velhos, e onde sentiamos a segurança dum bunker quase impenetrável. Viva a mulembeira, o imbondeiro e a mangueira, quanta imponência, espero que todos as respeitem como nós. Ainda um dia as quero voltar a abraçar.

A mulemba secou

A mulemba secou.
No barro da rua,
Pisadas, por toda a gente,
Ficaram as folhas
Secas, amareladas
A estalar sob os pés de quem passava.

Depois o vento as levou...
Como as folhas da mulemba
Foram-se os sonhos gaiatos
Dos miúdos do meu bairro.

De dia,
Espalhavam visgo nos ramos
E apanhavam catituis,
Viúvas, siripipis
Que o Chiquito da Mulemba
Ia vender no Palácio
Numa gaiola de bimba.

De noite,
Faziam roda, sentados,
A ouvir, de olhos esbugalhados
A velha Jaja a contar
Histórias de arrepiar
Do feitiçeiro Catimba.

Mas a mulemba secou
E com ela,
Secou tambem a alegria
Da miúdagem do bairro;
O Macuto da Ximinha
Que cantava todo o diaJá não canta.

O Zé Camilo, coitado,
Passa o dia deitado
A pensar em muitas coisas.

E o velhote Camalundo,
Quando passa por ali,
Já ninguém o arrelia,
Já mais ninguém lhe assobia,
Já faz a vida em sossego.

Como o meu bairro mudou,
Como o meu bairro está triste
Porque a mulemba secou...
Só o velho Camalundo
Sorri ao passar por lá!...

De: Aires Almeida Santos

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