domingo, 28 de junho de 2009

Sou aquela espécie
Que
Se sou repelente
E assusto
Quem passa por mim,
Também sou
Capaz de atraír
Quem me vê
E me admira...
Simplesmente
Porque eu sou assim...

É porque não sou
De espécie nenhuma.
Sou
Como que peça original
Que não tem,
Exactamente,
Nem bem,
Nem mal.
E que deixa
Qualquer um a questionar
De que tipo de tela,
Ou livro,
Ou estátua
Eu deveria fazer parte
Enquanto
Totalidade
[Ou pormenor]
De uma peça de arte.

Sou
Como que
Cigana
Semi-inserida.
Não sou
Nem desejada,
Nem excluída.
E tenho um lugar
Destinado a mim,
Que todos questionam
Qual será,
Se estará bem delineado,
Ou se será apenas
Um lugar assim assim.

Teresa Belo

sexta-feira, 26 de junho de 2009

Aos meus amigos

Felizmente, existem grandes homens, poetas ou outros, que através de palavras, muita simplicidade, e uma enorme clareza de sentidos, nos avivam a memória e ajudam a manter as imagens que construimos ao longo do nosso tempo por lá.

Jose Lobo Pires

"Quando surges na noite..."

Quando surges na noite, quando avanças
porque o som do batuque por ti chama,
teu corpo negro é chama que me inflama,
quando surges na noite, quando danças...
Quando danças, cantando as esperanças
e os desesperos todos de quem ama,
teu corpo negro é fogo que derrama
febre nas almas que repousam mansas.
Tu vens dançando (tudo em mim se agita)
e vens cantando (tudo em mim já grita),
quando surges em noite de queimada...
Depois, somos os dois, no mesmo abraço,
num batuque só nosso, num compasso
mais febril do que toda a batucada!


"As raízes do nosso amor"

Amo-te porque tudo em ti me fala de África,
duma forma completa e envolvente.
Negra, tão negramente bela e moça,
todo o teu ser me exprime a terra nossa,
em nós presente.
Nos teus olhos eu vejo, como em caleidoscópio,
madrugadas e noites e poentes tropicais,
- visão que me inebria como um ópio,
em magia de místicos duendes,
e me torna encantado. (Perguntaram-me: onde vais?
E não sei onde vou, só sei que tu me prendes...)
A tua voz é, tão perturbadoramente,
a música dolente dos quissanges tangidos
em noite escura e calma,
que vibra nos meus sentidos
e ressoa no fundo da minh'alma.
Quando me beijas sinto que provo ao mesmo tempo
o gosto do caju, da manga e da goiaba,
- sabor que vai da boca até às vísceras
e nunca mais acaba...
O teu corpo, formoso sem disfarce,
com teu andar dengoso, parece que se agita
tal como se estivesse a requebrar-se
nos ritmos da massemba e da rebita.
E sinto que teu corpo, em lírico alvoroço,
me desperta e me convida
para um batuque só nosso,
batuque da nossa vida.
Assim, onde te encontres (seja onde estiveres,
por toda a parte onde o teu vulto fôr),
eu te descubro e elejo entre as mulheres,
ó minha negra belamente preta,
ó minha irmã na cor,
e, de braços abertos para o total amplexo,
sem sombra de complexo,
eu grito do mais fundo da minh'alma de poeta:
- Meu amor! Meu amor!

Geraldo Bessa Victor (Angola)
Enquanto envolta
Em ninho
Abandonado,
Eu não me sinto
Nem melro,
Nem pardal;
Quando olho o Céu
E finjo que tenho
Asas
E sinto que não vôo
Nem bem
E nem mal.
Quando eu sinto
Que sou
De quem eu fujo
E porque te sinto aproximar
A ti,
Enrosco-me em desejos de vergonha
E finjo ser
Pequeno colibri.

Sta. Clara, 04-01-2008
Teresa Belo

segunda-feira, 22 de junho de 2009


África no corpo e na alma...

Os teus defeitos são graças
desse mistério profundo...
Saudade de duas raças
que se abraçaram no mundo!

Tomaz Vieira da Cruz (Angola)


"Poema para a Negra"

Deixa que os outros cantem o teu corpo
que dizem feiticeiro e sedutor,
e, na volupia vã do pitoresco,
entoem madrigais á tua dor.
Deixa que os outros cantem teus requebros
nos passos de massemba e quilapanga,
e teus olhos onde há noites de luar,
e teus beiços que teem sabor de manga.
Deixa que os outros cantem os teus usos
como aspectos formais da tua graça,
nessa conquista facil do exotismo
que dizem descobrir na nossa raça.
Deixa que os outros cantem o teu corpo,
na captaçãoo atonita do viço
e fiquem sempre, toda a vida,
a olhar um muro de mistério e de feitiço...
Deixa que os outros cantem o teu corpo
- que eu canto do mais fundo do teu ser,
ó minha amada, eu canto a propria África,
que se fez carne e alma em ti, mulher!

Geraldo Bessa Victor (Angola)

domingo, 21 de junho de 2009

Sem palavras.
As palavras dizem tudo. Foi, é, e será a nossa terra.
A nossa terra para sempre.
Sempre, mas sempre, por mais que custe será a nossa terra.
Palavras?
porquê e para quê?

Um abraço do tamanho do mundo e mil palavras para ti

Jose Lobo Pires

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GUERRA

Dois meninos sentados
um terceiro de pé
todos irmanados
na orfandade de um pé.


EXÍLIO

Tange, tange kissange
ele absorto
ela magoada.

E o sonho morto.

Toda a memória não é nada
para tantos desenganos,
na larga factura dos anos!

E a mente tão cheia
de tanta terra alheia!

Tange, tange kissange
recordar não cansa
chorar não consola
nem os descansa
de pensar em Angola.


Manuel Guerra dos Santos Lima

sexta-feira, 19 de junho de 2009

Não consegui identificar o autor. Também não importa muito, pois o seu a seu dono pertence e seguramente ele o saberá. Quanta simplicidade e conteúdo é possivel em meia dúzia de frases. Liberdade para poder estar em qualquer lugar, sempre, onde e quando lhe aprouver, mesmo que apenas em sonho ou pura fantasia.

Rasgo de Inefável

Queria ter chegado nos momentos para te escutar
Era tarde, talvez...
Algo voou de mim ao encontro
veloz instante que o corpo não pode alcançar
liberta-se e vai contigo
Fica um espaço estranho de ausência

quinta-feira, 4 de junho de 2009

De poema em poema se vai respondendo:

Molhar a pena
Num pote de mel
E escreverDocemente
A precisa caracterização
Do sabor do fel.
Dizer-te
O amargo
Que já provei.
Aquela angustiante
Sensação,
Que me leva
A ver
A doçura
Da contraposição,
QueP'ra quem desconhece
O que é a dor,
Ou sabe mal,
Ou não tem sabor.

Lx.02-06-2009

Teresa Belo

segunda-feira, 1 de junho de 2009

Amigos,

Concerteza já se deram conta de que sou um apaixonado por poemas musicados. Uma vez mais quem não ouviu já este poema na voz do grande Ruy Mingas. Mas tudo isto tem uma explicação. Ainda candengue , tentei "aprender "alguns acordes, e na minha santa inocencia, alheio ás politiquices dos mais velhos, cantava aquelas a que hoje chamamos de canções de intervenção, políticas sei lá ..! Mingas , Zeca Afonso, Adriano etc.., todas elas de facto carregadas de uma mensagem que muito francamente na altura não entendia bem.
Poemas que carregam historias intemporais , onde podemos ler imagens , sentir cheiros e, estar lá mesmo estando aqui. O facto de se premitirem musicar, de forma tão expontanea e simples, é algo que me impele a uma partilha cumplice de sentimentos e sentidos que não consigo amiúde usar e gozar e que tanto prazer me dão.
Quero continuar a senti-los, ouvi-los e vê-los pois acicatam-me as recordações, e brindam-me com novas lembranças de quando era um menino inocente.

Noites de luar no morro da Maianga

Noites de luar no Morro da Maianga
Anda no ar uma canção de roda:
"Banana podre não tem fortuna
Fru-tá-tá, fru-tá-tá..."
Moças namorando nos quintais de madeira
Velhas falando conversa antigas
Sentadas na esteira
Homens embebedando-se nas tabernas
E os emigrados das ilhas...
- Os emigrados das ilhas
Com o saldo mar nos cabelos
Os emigrados das ilhas
Que falam de bruxedos e sereias
E tocam violão
E puxam faca nas brigas...
Ó ingenuidade das canções infantis
Ó namoros de moças sem cuidado
Ó histórias de velhas
Ó mistérios dos homens
Vida!:
Proletários esquecendo-se nas tascas
Emigrantes que puxam faca nas brigas
E os sons do violão
E os cânticos da Missão

Os homens
Os homens
As tragédias dos homens!

Mário António